Anos a fio andei à espera que a Academia Sueca galardoasse Philip Roth com o Nobel da Literatura embora a fama de misógino o vá tornando cada vez mais intragável para quem enfatiza as mensagens feministas independentemente do mérito literário em causa. Agora tenho esperado que seja Don DeLillo a merecer uma benesse que continuo a considerar totalmente injustificada para um cantor interessante quando era muito jovem, mas depressa envelhecido (no pior sentido!) ao ponto de assumir equívocos comportamentos ideológicos.
Antes de me encantar com Um Homem em Queda, já Libra, Mao II ou Submundo me tinham convencido do seu talento. Mas o livro sobre o 11 de setembro de 2001 constituiu o definitivo relato ficcional sobre um acontecimento afinal não tão marcante quanto na altura pareceu. Mesmo que ainda há pouco tenha sido lembrado a propósito dos vinte anos entretanto passados. Os extratos escolhidos por Isabel Lucas para um dos melhores textos produzidos para a ocasião devolveram-me o fascínio sentido perante uma leitura que ainda revisitarei se a vida me der tempo bastante para essa e outras, que encararei com a curiosidade de saber que efeito produzirão anos passados sobre o deslumbramento inicialmente sentido. Aqui ficam em jeito de “petit apéro”:
“Deixara de ser uma simples rua, era agora um mundo, um tempo e espaço de cinza a tombar e quase noite. Ele caminhava para norte através do entulho e da lama e havia pessoas que o ultrapassavam a correr, com toalhas encostadas ao rosto ou casacos a cobrir a cabeça. Tapavam a boca com lenços de assoar. Traziam sapatos nas mãos, uma mulher com um sapato em cada mão surgiu a correr e deixou-o para trás. Corriam e caíam ao chão, algumas, confusas e desajeitadas, enquanto os destroços iam tombando à sua volta, e havia quem se abrigasse debaixo dos automóveis.” (...)
“O rugido permanecia no ar, o ronco distorcido da queda. Agora, o mundo era assim. O fumo e a cinza rolavam pelas ruas fora e dobravam as esquinas, irrompiam brutalmente às esquinas, ondas sísmicas de fumo com folhas de papel timbrado a surgirem em lampejos, folhas de formato padronizado com bordos cortantes, a pairarem, arrastadas num sopro, coisas inimagináveis na cortina de fumo matinal.”
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