domingo, setembro 19, 2021

Milos Forman, une vie libre, Helena Trestikova e Jakub Hejna (2019)

 

Pode-se gostar de quase todos os filmes de um realizador e sentir uma profunda antipatia pela pessoa que ele era? A resposta afirmativa encontra-se eloquentemente demonstrada no documentário, que Helena Trestikova e Jakub Hejna dedicaram à biografia de Milos Forman na sequência do seu desaparecimento em abril de 2018.

É  verdade que do período checo muito apreciei “ Os Amores de uma Loira”  ou “ O Baile dos Bombeiros”. Ou que houve pleno merecimento quanto aos Óscares recebidos graças a “Voo sobre um ninho de cucos” ou  “Amadeus”. Mas escutam-se as palavras de Forman e incomodam quanto ao seu anticomunismo primário, que realça a Liberdade como um valor em si, sem questionar a fundamentação dela estar restringida numa sociedade em que se procurava uma maior equidade social. Ideologicamente a inconsistência de Forman é evidente, denotando uma falta de ponderação sobre o tipo de sociedade em que vive. Mesmo o seu projeto sobre “Hair”  revela a ambiguidade de aparentar simpatias pelos valores da contracultura dos anos 60, quando afinal confessa o tédio inerente a ter convivido com uns quantos hippies, que lhe faziam simpatizar sobretudo com os progenitores incrédulos com a evolução ideológica dos seus rebentos.

Mesmo na vida afetiva Milos Forman revelou evidente egoísmo ao descartar-se rapidamente de Vera, a mãe do seu primeiro par de gémeos, quando em Paris sentiu saudades de casa e para ela quis voltar com os filhos, e ele decidiu partir para o sonho americano na expetativa de nele ganhar notoriedade e riqueza.

O egocentrismo do realizador é evidente ao longo de todo o filme: fala de si, de si, se si, e ainda de si, sem nunca verbalizar um pensamento que seja sobre as sociedades em que viveu. E a Liberdade, ou a falta dela, serve-lhe de capa para encobrir essa cegueira perante um mundo que muito mudou desde a queda do muro de Berlim e não necessariamente para melhor. Acresce, finalmente, a sua amizade com Vaclav Havel, um oportunista muito promovido pela sociedade ocidental, mas cuja relevância histórica resumiu-se a contribuir para derrubar um regime e substitui-lo pelo capitalismo selvagem, que fez da República Checa aquilo que hoje é! 

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