Nos últimos anos tenho lido romances policiais de autores nórdicos. Na sequência dos sucessos de Stieg Larsson, e sobretudo do fascínio em mim causado pelos romances do recém-desaparecido Henning Mankel, tenho regressado a paisagens, que tive o privilégio de conhecer durante os anos de navegação pelos portos noruegueses, suecos e islandeses.
Foi um tempo de deslumbramento, porque essas viagens aconteciam sempre no verão, quando os dias quase reduziam as noites a períodos muito curtos, sobretudo ao aproximarmo-nos das latitudes mais boreais, quando era paradoxal ser fotografado no convés superior com um copo de vodka orange na mão, o sol no horizonte e os relógios a marcarem as duas da madrugada.
As imagens então retidas do rasto do paquete nas águas dos fiordes, enquanto imperava a verdura crepuscular à nossa volta, são imorredoiras na minha memória.
No entanto, o romance de Mons Kallentoft remete para outra realidade bem diferente, apesar de radicadas nas mesmas paisagens: as do inverno mais agreste.
Quando «Sangue Vermelho em Campo de Neve» se inicia está a viver-se um dos invernos mais frios de que há memória, com temperaturas da ordem dos -40ºC. É, então, que é descoberto o cadáver de um homem completamente nu, pendurado num castanheiro. Desfigurado, apunhalado e abandonado, está suspenso de uma corda no meio de nenhures.
A brigada policial encarregada da investigação integra Malin Fors e Zackarias Martinsson, conhecido por Zeke. A primeira preocupação, que lhes assiste é identificar a vítima:quando se consegue reconstituir o rosto do morto, ele é reconhecido como sendo Bengt Andersson, um marginal que adorava assistir aos jogos de futebol da equipa local, servindo-lhe de apanha-bolas.
Vivia sozinho sem que ninguém por ele se interessasse. Mas um velho dá algumas indicações elucidativas a seu respeito: a mãe morrera de cancro e o pai era um homem violento, que agredia frequentemente a mulher e os filhos.
Um dia, não o podendo suportar mais, Bengt acertara com o machado numa orelha do pai, que se pusera em fuga. A irmã mudara, então, de nome - passara a chamar-se Rebecka Stenlundh - e arranjara emprego no supermercado.
Os polícias orientam as suas investigações para uma seita liderada por Richard Skoglof, que pratica sacrifícios com animais, mas não encontram razões para duvidar dos alibis com que são confrontados.
No entretanto vamos conhecendo as particularidades da vida pessoal de Malin, que está a contas com a adolescência da filha e com as suas próprias carências de mãe solteira. E também as idiossincrasias de uma região onde a meteorologia exerce uma influência determinante nas atitudes de quem ali habita. As pessoas fecham-se em casa e não parecem importar-se com quem mora a seu lado. Sobrevivem os que formam clãs, porque os solitários estão condenados à morte. Não se trata, assim, de um retrato muito favorável de um país tão elogiado pelas suas preocupações sociais.
Mons Kallentoft revela-se extremamente talentoso logo neste primeiro de oito romances, que já dedicou à sua personagem Malin Fors. Ela é cativante e o ritmo da ação é movimentado, recorrendo a frases, parágrafos e capítulos curtos.
Continuo a preferir os romances de Menkell com o inspetor Wallander, mas não enjeito a oportunidade de ler outros com esta Malin Fors. Até porque, se este é passado no Inverno, os outros ocorrem nas outras estações do ano.
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