Primeiro romance neste ano mal começado: “Um Cão no Meio do Caminho” de Isabela Figueiredo. E, como sucedeu com “A Gorda”, foi grata experiência, ao agregar à vasta galeria de personagens que me têm acompanhado desde idos de 60, esse José Viriato e essa Beatriz tão dissonantes dos vizinhos no ambiente suburbano desta margem sul da capital, ao mesmo tempo dela tão próxima na geografia e tão distante nas aparências cosmopolitas.
Um é respigador numa sociedade, que desperdiça muito do que a apetência consumista torna obsoleto e tem ainda utilidade. A outra acumula-o com a obsessão de quem o imagina garantia da sobrevivência num futuro, que nunca justificará essa fobia. Num e noutro a reivindicação da hipótese de felicidade com contornos radicalmente diferentes dos que os olham, os criticam, como gente na fronteira da marginalidade.
A outra margem, a que está defronte das luzes da cidade, assume, nessa opção de vida, outra forma de se exprimir.
Há nos romances de Isabela a apetência por uma utopia em que o racismo e as desigualdades sociais não se revelem tão gritantes. Singulares, os personagens parecem nada fazer para abreviar a sua concretização mas, diferentes dos demais, acabam por revelar a possibilidade de se sobreviver e, até ser feliz, no viver em contracorrente com o que tende a ser o “normal”. Sendo assim uma forma de irreverência apenas a um passo da revolta pela qual um outro mundo possa vir a ser possível.
Por tudo isso comecei o ano literário da melhor maneira e cá fico à espera dos novos personagens que a autora me continue a trazer ao conhecimento...
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