De que sorri a rapariga, que Vermeer pintou em 1657, na condição de interlocutora do oficial que, nem para a ocasião, se separou do imponente chapéu em pele de castor? Estará a ouvir-lhe os planos para um futuro promissor a dois, quando aceder a entregar-se-lhe depois de concluído o noivado? Será que ele invoca a possibilidade de zarparem para outras terras num dos navios da Vereenigde Oost-Indische Compagnie (VOC), então responsável pelas fortunas exponenciais angariadas pelos comerciantes de uma república emancipada dos espanhóis sete décadas antes? Ou, como sugerem, espíritos mais maliciosos, a mão aberta da jovem é a de uma meretriz a solicitar o pagamento do serviço para que, a seguir, se disponibilizará?
Curioso como um pequeno quadro, com meio metro de altura e pouco menos de largura, tem suscitado tantas teorias. Há quem lhe sublinhe as opções estéticas com a luz a provir da janela aberta, iluminando o rosto da personagem feminina e deixando-nos na sombra as costas do oficial. Ou as sucessivas linhas de fuga a convergirem-lhe no chapéu.
A análise mais detalhada foi a de Timothy Brook, que viu no quadro múltiplas referências ao que, então, se passava nas sete províncias dos Países Baixos: a expansão marítima para a imposição do primeiro esforço bem sucedido de globalização, a afirmação de um capitalismo financeiro fundamentado na criação da Bolsa de Amesterdão onde as ações da VOC conheciam cotação invariavelmente ascendente e alavancavam outras com uma dinâmica especulativa, que nem a crise com os bolbos das tulipas em 1636 conseguira refrear.
Acresce ainda a curiosidade de o rosto da rapariga do quadro ser provavelmente o de Catharina Bolnes, a mulher do pintor e seu modelo em muitas das obras, que dele conseguiram sobreviver até aos nossos dias. E, nesse sentido, até que ponto não é ele o oficial numa autorrepresentação fantasiada já que, nunca alguma vez sairia de Delft para visitar os muitos destinos dos navios da Companhia das Índias Orientais como o produto do seu intenso labor nunca foi suficiente para propiciar à mulher e aos sete filhos mais do que uma remediada sobrevivência.
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