sábado, outubro 28, 2023

O faroeste de Georgia

 

Foi na primeira estadia em Nova Iorque, em meados dos anos 70: From the Faraway, Nearby (1937) foi o quadro exposto no MET, que deu-me a vontade de melhor conhecer a obra de Georgia O’Keeffee, pintora  pouco valorizada na errada opinião em como - apesar de Hopper e Pollock, ou demais expressionistas abstratos norte-americanos - a arte mais interessante continuava a ser a europeia. 

Não ajudara decerto o terem-me aparecido até então mais informações sobre os seus amores e desamores com o fotógrafo e galerista Alfred Stieglitz do que sobre a influência nela exercida por uma mãe de carácter forte capaz de libertar-se da condição de agricultora do Wisconsin para desejar melhor futuro às filhas, que pôs a estudar em pensionatos protestantes. Ou sobre as muitas dúvidas sobre o desejo de ser pintora, que lhe surgira aos 12 anos, e se vira condicionado pela falta de recursos e doenças, que ia contraindo, mormente o sarampo, que lhe chegou a afetar seriamente a visão. Ou, ainda, como a puritana Nova Iorque de 1946 se escandalizara, quando Stieglitz inaugurou uma exposição em que figuravam muitos dos seus nus. Ou, enfim, sobre os seus longos passeios a pé, a cavalo ou de carro pelo Novo México, em torno do seu rancho fantasma (The Ghost Ranch), quando para ali se mudara depois de mais uma das traições conjugais de Stieglitz, que se metera com Dorothy, a assistente que tinha sobre ela a vantagem de ser vinte anos mais nova.

Quer pintando as flores com uma expressividade, que nos incita a olhá-las com a atenção que quase nunca lhes dedicamos, quer dando testemunho de paisagens, que aprendeu a pintar por si mesma, de nada lhe servindo as opções tomadas por outros pintores apostados anteriormente em vertê-las para as telas, passei a dar outra atenção às suas obras embora voltassem a ser raras em que as pude ver noutro suporte que não os dos livros de arte.

Solitária por natureza, Georgia não enjeitou o convívio com a sociedade cosmopolita da cidade que nunca dorme - até por ter adquirido de Alfred os conhecimentos bastantes para valorizar e negociar as suas obras - e passou a constituir referência maior de uma cultura de que se tornou inegável ícone... 

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