segunda-feira, dezembro 12, 2022

MIOLO: O que aqui não se publica: Pete Fromm e Yesar Kemal

 

12 de dezembro de 2022

1. Foi um livro que Peter Fromm levou quinze anos a apurar até conseguir publicá-lo em 1993 e assim converter-se num dos nomes maiores da Escola do Montana, o filão de diversos escritores assumidamente vocacionados para o natural writing, ou seja para a descrição detalhada  do seu relacionamento com a Natureza selvagem das Montanhas Rochosas.

Fromm já era então ranger num Parque Natural, mas essa vocação, reforçada por uma licenciatura na Universidade do Montana, surgira inesperadamente no distante inverno de 1978, quando aceitara emprego para, durante sete meses, mergulhar solitariamente, na vastidão das florestas na fronteira com o Idaho e reportar o comportamento dos salmões. Tendo por companhia o seu cão, Fromm foi escrevendo um diário que um curso de escrita criativa, frequentado posteriormente, sugeriria ter valor literário. As crónicas de Indian Creek revelam como um jovem de hábitos urbanos aprende à sua custa como sobreviver nas rigorosas condições do inverno na região. Experiência brutal, que não lhe acentuam os valores ecologistas, reforçados por cenas que o indignam como o do fútil assassinato de um puma por caçadores apenas motivados pelo prazer de matarem. Essa é cena particularmente intensa no livro, que espelha página a página o rol de emoções capazes de lhe amadurecerem a personalidade e transformarem-no no escritor que viria depois a revelar-se.

2. Um dos centenários literários do próximo ano é o do nascimento de Yasar Kemal, decerto sujeito à indiferença do regime de Erdogan, que nele identifica valores absolutamente contrários aos seus. Em primeiro lugar, porque ele sempre se orgulhou da origem curda e nunca enjeitou a oportunidade para denunciar a modernidade trazida pela República de Atatürk, que acelerou - e de que maneira! - as desigualdades sociais e de rendimentos entre os latifundiários e os camponeses da sua planície natal, a de Çukurova.

Foi contra as injustiças e a opressão, que Kemal escreveu poemas e romances, que lhe valeram muitas prisões à conta das suas supostas simpatias comunistas. Sobre a dura existência dos mais pobres conseguiu instilar um sopro épico, que o identificaram num estilo muito seu.

A mudança para Istambul, em 1951, não lhe moderaram a vontade em ajudar ao surgimento de um mundo bem diferente, tornando-se também porta-voz dos defensores da vida selvagem insurgindo-se contra o abate de golfinhos nas costas turcas para deles se aproveitar industrialmente a gordura. Uma das muitas razões para, sete anos passados sobre a sua morte, não merecer grande relevância por um poder político, sobre que sempre teceu veementes críticas. 

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