Agora que se anda a discutir novamente a eutanásia a propósito da lei em vias de aprovar na Assembleia da República, e com mais uma demonstração de inábil jogo de cintura do líder da oposição para escapar cobardemente à declarada afirmação sobre o que pensa do tema, um filme como Blackbird de Roger Michell, estreado nos ecrãs lusos no ano transato, sabe a bem pouco. Apesar de ter Sarandon, Neill, Winslet ou Wasikowska no elenco, e aproveitar fotograficamente a paisagem da praia onde terá sido parcialmente rodada, acaba por ser uma espécie de pólvora seca num tipo de abordagem, que justificaria outro estrondo e focalização de alvo. Conjeturo o que faria Ingmar Bergman com este tema de uma família reunida num breve fim-de-semana para despedir-se da matriarca, apostada na voluntária eutanásia por ter a esclerose lateral amiotrófica a entrar na sua fase mais consternadora.
Apesar de remake de um filme realizado pelo dinamarquês Bille August, o argumento fundamenta-se nas tensões entre as várias personagens, mas é incapaz de as levar às dimensões paroxísticas dos mais interessantes títulos do realizador sueco. Os segredos sugerem a probabilidade de justificarem-se picos de emoções, mas, afinal, elas depressa afrouxam com uma verosimilhança difícil de aceitar. E sempre nessa sucessão tépida de muitas cenas concebidas na lógica de só se justificarem para prolongarem a história até à dimensão de longa-metragem, porque o conteúdo em si despachava-se em proposta mais curta.
Manifestamente conhecem-se melhores opções cinematográficas para facilitar debates animados sobre o tema em causa: Mar Adentro continua a ser uma das alternativas incontornáveis para quem está interessado em atiçar a chama de uma mudança civilizacional, que tarda em cumprir-se, porque os enfeudados aos preconceitos religiosos continuam a considerar-se legitimados no direito de imporem aos outros aquilo que pensam, por muito que contrariem os valores de quem vê na eutanásia a solução para pôr termo ao sofrimento de quem se sente definitivamente cansado da vida.
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