Um homem sentado numa cadeira tendo atrás de si um fundo completamente negro. Adivinhamo-lo septuagenário e ouvimo-lo recordar os três filhos de 2, 5 e 6 anos. Herman, Isaac e Andris, de quem ainda lhe custa falar, tantos anos passados, porque tivesse-os vivido com eles, e a Vida teria sido muito bela.
Disseram-lhe que num museu está exposta uma fotografia com eles e a progenitora, mas ele nunca a quis ver. Porque sabia-se incapaz de suportar o reencontro com o momento em que eles tinham posado para a câmara.
Entre 1942 e 1944 foram deportados 24915 judeus da Bélgica para Auschwitz, dos quais apenas 1206 sobreviveram.
Se as prisões e o transporte dos prisioneiros foram planificados pelos nazis, a execução foi conseguida com a colaboração voluntária ou inconsciente das autoridades belgas de então.
A Bélgica foi invadida em 10 de maio de 1940, com bombardeamentos, que semearam o pânico na população e causaram um número elevado de vítimas mortais.
Henri Kichka, então uma criança, lembra agora como os pais logo decidiram fugir para França, pois adivinhavam os perigos resultantes da sua condição judaica.
A 28 de maio as tropas belgas capitulam e o governo começa por se refugiar em França para, logo a seguir, estabelecer-se em Londres. Ao partir cada um dos ministros confiou aos funcionários hierarquicamente mais bem colocados nos respetivos ministérios - normalmente os secretários-gerais - os destinos do país, doravante ocupado.
Os alemães decidem sujeitar a Bélgica a uma administração militar, nomeando Alexander von Falkenhausen para governador, e Eggert Reeder para seu adjunto.
A missão principal destes dois homens era a de garantir recursos necessários ao custeamento do esforço de guerra nazi, mas também impor uma paz musculada, que evitasse a necessidade de ali estacionar demasiadas forças militares, que seriam prioritárias noutras frentes. Por isso começaram por utilizar inteligentemente a eficiente máquina administrativa belga. E, como a população depositava uma grande confiança na polícia, seria na capacidade para a colocar ao seu serviço, que o ocupante garantiu o cumprimento do seu objetivo.
Nos primeiros meses existiu uma colaboração sem grandes sobressaltos, dir-se-ia mesmo uma coexistência pacífica entre a administração militar e a administração civil. Coube a esta última organização do racionamento e o pagamento dos prejuízos causados durante as operações de ocupação.
Alexander von Falkenhausen, cujo pai administrara a Bélgica durante a Primeira Guerra Mundial, sabia que não deveria repetir a brutalidade então imposta aos belgas, sob pena de os ver reagir como então.
Durante esses primeiros meses de Ocupação a ordem resumiu-se a «sossegar» os ocupados e conseguiu ter sucesso. Nas ruas as bandas de música do Exército nazi davam concertos para as populações, que se resignavam com a nova ordem a que devem obedecer.
Mas os alemães tinham outro inconfessado objetivo: resolver a questão judaica.
(texto baseado no documentário «Modus Operandi» realizado por Hugues Lanneau, com argumento de Diane Perelsztejn)
Sem comentários:
Enviar um comentário