segunda-feira, outubro 05, 2020

(DL) Pegadas - Em Busca dos Fósseis Futuros, David Farrier

 


Comecei agora a ler este ensaio de David Farrier sobre os vestígios que, num futuro distante, os que viverem na Terra encontrarão da nossa passagem por ela. Embora se justifiquem as dúvidas quanto ao tipo de Humanidade, que possa então subsistir: tendo em conta a evolução que as alterações climáticas estão a sugerir como inevitáveis, ele procede a um exercício intelectual radicado no que de negativo está a acontecer nos nossos dias e serve de prenúncio ao que se seguirá. Por exemplo o que Ferrier testemunha na sua bem conhecida costa oriental da Inglaterra, lentamente a ser reclamada pelo mar e onde “edifícios que outrora não se viam desde a costa apinham-se agora junto a ela, e os proprietários vigiam atentamente a orla marítima que se aproxima, devorando, centímetro a centímetro, os jardins de que eles cuidam com tanto afeto. De tempos a tempos, uma casa desaba no mar. A terra sob os nossos pés dá-nos a sensação de ser provisória, como se pisássemos tempo emprestado.” Como não associar essa evolução à notícia de maio de 2013, quando cientistas do Observatório de Mauna Loa, no Havai. anunciaram que os níveis atmosféricos de dióxido de carbono tinham atingido as 400 partes por milhão (ppm) pela primeira vez em toda a História humana.”

A última vez em que essas concentrações tinham ultrapassado as 280 ppm foi a meio do Plioceno, ou seja há cerca de 3,5 milhões de anos, numa altura em que os nossos mais remotos antepassados começavam a divergir dos símios. Nessa altura “os mares estavam dezenas de metros acima dos níveis a que se encontram atualmente e a temperatura média global era cerca de 3 °C mais elevada.” Uma possibilidade, que tenderemos a conhecer num futuro próximo já que os políticos mais conscientes da ameaça vão fazendo os possíveis para não deixar que elas excedam 1,5ºC, mas sem garantias de conseguirem travar os negacionistas do clima. Aqueles que querem meter a cabeça na areia perante a possibilidade das colheitas agrícolas ficarem comprometidas, as cidades equatoriais inabitáveis e as ilhas e nações de baixa altitude afundadas.

Pior ainda serão as consequências do derretimento do pergelissolo do Ártico, que libertará níveis catastróficos de gases de estufa para a atmosfera. A acontecer ficaremos condenados a um clima semelhante ao do Plioceno durante muitos séculos.

Serviria de mitigado consolo a possibilidade de cessarmos de imediato a queima de combustíveis fósseis. Mesmo que isso acontecesse “os vestígios do dióxido de carbono que produzimos perdurariam por períodos de tempo impossíveis de conceber.” Há quem calcule em mil anos o tempo necessário para se reduzir a um terço a quantidade de dióxido de carbono atualmente na atmosfera. E “quando o último resíduo deste carbono finalmente abandonar a atmosfera, a humanidade terá vivido e evoluído ao longo de mais 4000 gerações. A linguagem e a comunicação ter-se-ão alterado para lá do nosso entendimento.”

Serão previsíveis, ainda neste século, as novas paisagens criadas pelas mudanças climáticas com “secas que aridificam a terra ou tempestades que a inundam e poderão criar vestígios fósseis próprios, à medida que os ecossistemas forem mudando ou colapsando por completo, e que a subida dos níveis do mar for tornando impossível a vida nas cidades costeiras.”

Podemos considerar que Farrier não nos diz nada de substancialmente novo para quem consciencializa o problema, mas dá um conjunto riquíssimo de informações, capazes de serem certeiramente atiradas à cara dos que as ignoram ou odeiam conhecer.

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