É daquelas coisas, que deveria contrariar, porque o filme é uma peça coral de reconhecido bom gosto. Ademais a fotografia é irrepreensível, refletindo o esteticismo de Derek Jarman e surgem atores e atrizes de quem gosto muito (Tilda Swinton) ou mais ou menos (Laurence Olivier ou Sean Bean). Mas convenhamos que, na música erudita do século XX, nunca consegui apreciar as criações de Benjamin Britten.
Porquê, não o saberia explicar. Apenas que, nas salas de concerto, devo a ele algumas das mais enfadadas experiências de que me lembro, convencendo-me da tendência para doravante passar ao lado dos programas com propostas da sua lavra.
Embirração inexplicável? Talvez! Mas também não me confesso particularmente apoiante do pacifismo puro e duro, dada a aceitação do princípio fundamental de que possam vir a existir guerras justas (contra o capitalismo, como no passado o foram as contra o fascismo e o colonialismo) em contraponto com as muitas injustas atualmente em curso.
"War Requiem" (1989) é a adaptação cinematográfica que Derek Jarman fez da obra coral homónima de Benjamin Britten, composta em 1962 para a consagração da nova Catedral de Coventry - reconstruída após ter sido destruída pela Luftwaffe durante a Segunda Guerra Mundial. Britten entrelaçou a missa de réquiem latina com poemas de Wilfred Owen, poeta inglês morto na Primeira Guerra Mundial uma semana antes do armistício. É uma obra monumental sobre o horror da guerra e a inutilidade da morte em combate.
Jarman, cineasta visceralmente político e sempre atento às feridas da História, transforma a peça coral numa experiência visual poderosa. A fotografia, a cargo dele próprio, alterna entre o preto e branco (para as cenas de trincheiras, hospitais militares, cemitérios) e breves irrupções de cor (para os momentos de transcendência ou memória).
Tilda Swinton surge como uma enfermeira espectral que atravessa os cenários de destruição; Laurence Olivier, na sua derradeira aparição em cinema, interpreta um velho soldado confrontado com as memórias; Sean Bean encarna um dos soldados caídos cujos poemas de Owen pontuam a obra.
O esteticismo de Jarman está presente em cada plano: as composições pictóricas, a utilização expressionista da luz e da sombra, os movimentos de câmara lentos e contemplativos que transformam a guerra não num espetáculo de ação mas numa meditação fúnebre. É belo, inquestionavelmente. É bem-intencionado, sem dúvida. Mas há qualquer coisa de excessivamente reverencial no conjunto - como se a beleza formal anestesiasse o horror que pretende denunciar.

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