Regresso a Chaplin com o prazer de sempre e sob os mais anódinos pretextos. Por exemplo o de passarem cem anos sobre a estreia de «The Kid», o filme por muitos considerados como primeira-longa-metragem do ator-realizador, mas quase não durando uma hora.
Divertido nos imaginativos sketches, que não ganharam qualquer caruncho - mesmo que doravante muito glosados! - o filme tem o lado sombrio por espelhar os demónios passados do seu criador e os que continuavam a assolá-lo por essa altura.
Em época de ruturas - desde a conjugal, quer a que mantinha com os seus produtores - Chaplin cria uma evidente homenagem à mãe nessa personagem, que abandona o filho depois de ter contra si o seu “único pecado” anunciado logo na legenda de abertura.
Havia também o desejo de paternidade por parte de quem acabara de perder o filho de três anos, quando tinham apenas decorrido duas semanas desde o começo das filmagens. Daí a empatia profunda entre o pai e o filho adotivo numa cumplicidade idealizada, que nenhuma oportunidade poderá pôr em causa. Nem sequer a que pretenderia levar o miúdo para um orfanato.
É claro que podemos sempre travar a emoção suscitada pela história com os seus acasos felizes - a forma como mãe e filho se voltarão a encontrar! - mas não são tantas as ficções, mesmo atuais, que se baseiam nessas coincidências improváveis? E não é por isso que pomos em causa a sua veracidade quando são imaginadas por Paul Auster ou Haruki Murakami.
Cem anos depois este continuará a ser um dos meus mais jubilatórios prazeres cinéfilos.
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