Rolf pede a Eva Luna, que lhe conte histórias. E, qual Xerazade, ela fá-lo, tomando por protagonistas sucessivas mulheres.
Belisa Crepusculario, por exemplo, nasceu muito pobre, mas aprendeu a importância das palavras para se sustentar com o seu uso, escrevendo cartas para quem as não saberia escrever ou inventando-as para quem delas precisasse para emitir inéditos e contundentes insultos. Um dia, um coronel, apostado em ser presidente, decide calar as armas na guerra civil e conseguir dela um discurso capaz de se traduzir em maioritários votos nos eleitores. Com imediato e espetacular sucesso. Mas duas palavras secretas, só a ele sopradas, desarmam-lhe a vontade e mortificam-no sem que os lugares-tenentes lhe devolvam a perdida belicosidade.
Elena Mejias consegue outro tipo de sortilégio no padrasto, por ela obcecado quando é uma jovem Lolita. Mas sem lhe encontrar aparente memória do assédio, durante anos sentido com complexo de culpa, quando a reencontra muitos anos depois na condição de austera noiva destinada a esposa de influente militar.
E há também Clarisa a surpreender na clandestina contradição entre a sua muito admirada santidade e aquilo que dela descobre quem lhe conta a história: depois de dois filhos anormais, gerara dois perfeitamente competentes com um amante apenas para garantir aos mais velhos o apoio perdido, quando viesse a morrer.
Nos três primeiros contos do livro as mulheres têm duas facetas, a benigna e a mágica na primeira, a sedutora e a sisuda na segunda, a piedosa e a infiel na terceira. Abrindo-se justificada expetativa para quantas vier a conhecer de seguida.
Entre o realismo mágico e as peculiaridades de um subcontinente a contas com a aguerrida ânsia de poder dos homens, são as mulheres quem, clandestinamente, parecem condicionar-lhes os destinos...
Sem comentários:
Enviar um comentário