1. Um romance policial de Frédéric Lanoir e Violette Cabesos (La Promesse de l’Ange) e um documentário de Marc Jampolsky (Mont-Saint Michel, le labyrinthe de l'archange) andam a compensar da frustração de não regressar a um dos sítios mais impressionantes em tempos, visitado.
Inesquecível aquele dédalo de ruelas, as escadas de acesso às vinte cinco salas distribuídas por vários pisos com muitas passagens secretas pelo meio ou a maré fortíssima, capaz de avançar mais rápida que o galope de um cavalo. Sentem-se ali os quinze séculos de uma história intensa, que fez de um edifício arquitetonicamente improvável, uma sucessiva abadia, fortaleza ou, até, prisão. E, por isso mesmo, incapaz de esgotar-nos a fértil curiosidade.
2. Outro documentário - La Véritable Histoire des Pirates de Stéphane Bégoin - demonstra-nos existir muito mais história sobre os aventureiros comummente associados às Caraíbas ou ao Golfo do México, porque foca-se nas pesquisas arqueológicas empreendidas por equipas de investigadores em torno de navios naufragados ao largo de Madagáscar ou da Maurícia.
De facto, o oceano Índico foi fértil em flibusteiros apostados em emboscarem navios portugueses e holandeses, provenientes das Índias e do Extremo Oriente. Forma expedita de ingleses e franceses torpedearem os efeitos do Tratado das Tordesilhas de que se tinham visto postos à parte.
O fenómeno da pirataria até se iniciara em terra quando, na costa da Cornualha, as populações costeiras começaram e plantar falsos faróis em terra para atraírem incautos capitães, que viam assassinadas as tripulações e roubadas as respetivas cargas.
Ademais interessante a forma relativamente democrática como os piratas costumavam dividir os saques: igualmente por todos, exceto a parte do capitão, que era a dobrar, sendo ele previamente eleito por todos os companheiros.
E, enfim, a forma contraditória como os piratas cuidavam dos escravos encontrados a bordo dos navios atacados: ora revendiam-nos aos comerciantes, que lhes serviam de recetores das mercadorias, ora os integravam nas respetivas tripulações acaso as sentissem desfalcadas.
3. A pretexto da passagem de mais um aniversário sobre a data do regicídio na rua do Arsenal, a RTP Memória sacou dos arquivos um documentário mal amanhado sobre esse acontecimento recorrendo injustificadamente ao testemunho de familiares do Buíça ou do Costa, que pouco mais sabiam do que o medo de se verem alvo da ameaça de D. Amélia, que prometera matá-los até à quinta geração.
No mais valha-se o reconhecimento das culpas de D. Carlos ao aceitar a ditadura de João Franco e como a implantação da República era apenas uma questão de oportunidade, tão corroída estava a monarquia em insolúveis impasses.
4. Se a população portuguesa vivia então numa atroz miséria melhor não se encontrava a italiana, que procurava libertar-se da lamentável circunstância ao emigrar em sucessivas vagas para o outro lado do Atlântico.
Duas décadas depois do sucedido em Lisboa, a ditadura de Mussolini deportou o médico, pintor e futuro escritor Carlo Levi para o sul de Itália, dando-lhe a conhecer na pele a realidade contra a qual ele começara por combater em função da teoria comunista com que simpatizava, mas a partir de então bem mais visível aos seus olhos.
Solidário com essas populações miseráveis prodigalizou-lhes os cuidados médicos até então delas desconhecidos e ouveiu-lhe as histórias, que transformou literariamente de forma a enquadrem-se nos objetivos literários e políticos dos seus romances. O mais famoso é Cristo Parou em Eboli, que bem merece uma revisita, depois de lido há tantos anos.
O fascínio de Levi por essa Itália do sul ficou-lhe tão incrustado que, ao morrer, quis ficar sepultado em Matera, hoje património da humanidade, mas também vergonha nacional de um país, que tão mal cuidou dos que ali viviam em tugúrios nas suas cavernas.
5. Uma referência final para as novas obras adquiridas para o Museu Nacional de Arte Antiga, que justificam ali regressar para ver as obras de Giordano, Mantegna ou Tintoretto.
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