Pode haver alguma relação entre a coroação de Isabel II, que os monárquicos ingleses agora comemoram, e o terror propagado pelos estúdios da Hammer a partir desses anos 50? O horror de que é feita a galeria de gente, que povoa os palácios de Westminster ou de Windsor, não terá justificada ligação com os muitos dráculas e personagens afins interpretados por Christopher Lee, Vincent Price ou Peter Cushing?
Existe, de facto, uma dualidade causa-efeito entre essas realidades tão distintas: a cerimónia real foi transmitida pela então recente televisão britânica contribuindo para o sucesso desta, retirando multidões das salas de cinema e levando os estúdios cinematográficos à falência.
Foi para a tentar evitar que os Bray Studios se reinventaram com um tipo de histórias capazes de manterem um fluxo de espectadores minimamente rentável para adiar o acelerado fecho da maioria das salas de cinema. A fórmula para o conseguir foi o recurso ao sexo e à morte a cores.
Mesmo que realizado de forma muito sumária como resistir a Raquel Welch em bikini a escapar à ameaça de terríveis dinossauros ou a transformação explicita de pessoas normais em seres monstruosos? Para não falar da devolução de dignidade a personagens - Frankenstein ou Drácula - nascidos na literatura europeia e que os estúdios de Hollywood, sobretudo a Universal, andavam a caricaturar em comédias com Abbott e Costello. Ademais, a ambiência gótica contribuía para conferir estilo identitário a um tipo de filmes a que o sotaque british acrescentava credibilidade.
Os críticos sempre zurziram nesses filmes, mas o custo contido inerente aos critérios do cinema independente, garantiu-lhes a rentabilidade. Até que Alfred Hitchcock estreou Psico e mostrou como o mesmo tipo de temas, se explorado pela Hammer, parecia subitamente obsoleto. Se os seus responsáveis tinham-se revelado revolucionários aquando da criação e lançamento de The Quatermass Experiment mostravam-se doravante incapazes de desenlearem os desafios, que pareciam tolhê-los progressivamente mais. A resposta do estúdio inglês limitou-se à diversificação das temáticas, incluindo as que procuravam imitar o mestre do suspense criando diversos sucedâneos naquilo que alguns designaram como mini-Hitchcocks e até contratando Bette Davis para um deles: The Nanny.
Logo a seguir, aquela que foi a machadada definitiva, aconteceu com A Noite dos Mortos Vivos de George Romero, que anunciava a chegada de uma nova geração de cineastas (John Carpenter ou o Friedkin de «O Exorcista»), que trazia Hollywood de volta a um dos principais players do género. A Hammer estava inevitavelmente condenada.
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