sábado, outubro 09, 2021

A Baía dos Anjos, Jacques Demy, 1962

 

Tão diferente é este segundo filme de Jacques Demy comparativamente com os que depois rodaria  e de que nos lembramos, sobretudo de «Os Chapéus de Chuva de Cherburgo»  (1964) e «As Donzelas de Rochefort» (1967). Andava ele à procura de quem lhe financiasse o primeiro daqueles dois filmes com Catherine Deneuve, quando teve contacto com o microcosmos dos casinos do sul de França, rapidamente surgindo a ideia de uma história carecedora de poucos meios e feita com a sobriedade de um Robert Bresson. É assim que conhecemos Jean Fournier, um modesto empregado bancário a quem um cínico colega induz o vício do jogo.

Em rutura com o pai, um relojoeiro apostado em eliminar o acaso do decurso do tempo, ele instala-se em Nice e conhece a rainha das salas de jogo, a platinada Jackie (Jeanne Moreau), por quem se enamora e a quem segue até Monte Carlo. A vida torna-se-lhe aleatória condicionada pela imprevisibilidade dos acontecimentos. Mas, ao mesmo tempo, Demy adota a perspetiva de um documentarista ao filmar os bairros populares como já não eram vistos desde que Jean Vigo ali rodara »À Propos de Nice» (1930).

Entre o feitio de cigarra de Jackie e o de formiga (mesmo que expulsa do ambiente familiar) de Jean tenderia a cavar-se uma incompatibilidade, afinal traduzida no aprofundamento do potencial salvífico do amor. E é ele a emancipar o casal de uma acelerada vertigem, que tenderia a empurrá-los para o abismo. Com a música de Michel Legrand a embalá-los para mais esperançoso futuro. 

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