segunda-feira, dezembro 14, 2020

(DIM) Entre a coragem dos anarco-sindicalistas e as patologias americanas

 

1. Sou por princípio contra a formulação de possíveis versões de história alternativa mas vale a pena fazer uma breve exceção para questionar o que teria acontecido se o atentado de 4 de julho de 1937 contra Salazar tivesse resultado. Como se aguentaria a ditadura sem o seu cabecilha? Chegaria a democracia mais cedo, poupando-nos ao atraso instituído desde o fim da República e prosseguido até aos anos setenta, ou algum sucessor encontraria artes de manter o regime? E, acaso não o conseguisse, tentaria o vitorioso Franco anexar um território, que sempre cobiçou?

Nunca saberemos o que resultaria de tal hipótese, mas uma coisa é certa: o documentário de Edgar Feldman sobre Emídio Santana, o corajoso anarco-sindicalista, que participou no valente susto por que passou Salazar, justifica a nossa admiração pela forma como sempre encarou a ação política: procurando transformar a sociedade do seu tempo, mobilizando o esforço dos mais desfavorecidos e propiciando-lhes as condições necessárias para se instruírem e ganharem o sentido crítico exigido para porem em causa o que merecia sê-lo!

2. A comida de plástico tem causado uma devastadora epídema de obesos na sociedade norte-americana. Sabíamo-lo, mas afigura-se-nos inimaginável a atitude irracional de muitos dos que padecem desse mal comportando-se de acordo com a adaptação de um conhecido provérbio popular: se nada podes contra ele, rende-te sem remorsos aos seus mais ilimitados excessos. Daí os inacreditáveis sucessos empresariais com restaurantes onde não há quaisquer legumes ou fruta nas refeições, pelo contrário apenas constituídas de carne, pão e molhos gordurentos. Há quem se bata, por exemplo, com hamburguers de oito andares, pesando três quilos e correspondendo a vinte mil calorias. Ou, não menos singular - embora pateticamente ridículos - são os concursos para a eleição das misses gordas de cada Estado, depois levadas para a final envolvendo representantes de toda a América. Exibições de fútil infantilidade, esses concursos de beleza revelam uma América satisfeita consigo mesma, decidida a nada mudar nas muitas patologias sociológicas, que a caracterizam. O que explica a votação de um Trump, decerto ídolo implícito deste tipo de gente...

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