1. Perante um documentário sobre a difícil vida dos elefantes no deserto do Calaári, vejo confirmada a opção de montagem já há uns bons anos seguida pelos realizadores da BBC ou da National Geographic: sabendo que os filmes estão destinados a um público familiar de todas as idades quase nunca dão a ver uma caçada bem sucedida de predadores a presas fáceis de merecerem a nossa simpatia. Por isso são mais as vezes que vemos as chitas, os leões ou os mabecos falharem os objetivos do que conseguirem-nos. E se isso sucede não há racord entre a presa em causa e a que vemos depois já semidigerida, quando se quer mostrar os felinos em repasto.
No documentário desta tarde não houve um único elefante derrubado pelos leões que, nessa região do Botsuana, ganharam fama de ferozes caçadores de paquidermes. Um macho jovem ou uma cria, alvos da cobiça dos predadores, conseguem livrar-se deles com a ajuda da família. E quando o filme mostra um desses gigantescos animais a atrair a atenção dos necrófagos já outros motivos lhe terão dado o triste desiderato, seja a fome, a sede ou a doença.
O que justifica que nos questionemos sobre que Natureza nos é revelada nesse tipo de documentários? A que efetivamente existe com a sua crueldade selvagem, que não admite condescendências nem piedades, ou uma versão delicodoce de acordo com uma tradição documentarista, que muito radica na tradição disneyana de humanizar o que não se enquadra nos seus padrões?
2. Não digo que o mais importante no livro que estou a ler sejam os detalhes. O autor até me é simpático, levando-me a comprar-lhe quase todos os romances (e já vai em dezasseis!). Mas quando dou por erros crassos, que um trabalho de edição a sério - como o realizado por exemplo por um Zeferino Coelho - não deixaria passar, a verosimilhança da história fica posta em causa.
O autor, demasiado jovem para ter vivido essa época, julga que nos anos imediatamente anteriores ao 25 de abril os liceus tinham turmas mistas e ainda ostentavam os retratos de Salazar, a maioridade já era aos 18 anos ou a pornografia animava os adolescentes como se fosse mais fácil de encontrar do que as edições clandestinas do Avante. Ademais não apareciam mirones nos sítios periféricos escolhidos pelos namorados para se deleitarem com as primeiras carícias nem polícias que fiscalizassem os jovens, que conduzissem sem carta os carros dos papás.
A narrativa até pode-se considerar interessante, mas que dizer do diabo dos detalhes?
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