1. Contraditório sou sobre as muitas leituras e imagens, que vou visitando no dia-a-dia. Posso apreciar algumas coisas, mas manter a antipatia sugestionada por antigos juízos nos assuntos que versam.
Natália Correia - que vai estar na berlinda até, pelo menos, à data do centenário do seu nascimento (13 de setembro) - é disso eloquente exemplo. Admirei-a antes da Revolução de Abril quando, apesar de já não ser jovem, era alma fortemente censurada. Passei-a depois a detestar durante o PREC por ter sido sua emotiva inimiga. Fiquei melhor predisposto com as suas posições, quando saiu do PSD por causa da despenalização do aborto, ou da amnistia para os presos das FP-25, e ri-me gostosamente com os versos dedicados ao Morgado.
Li-a pouco, porque não me revi nos conceitos, que enunciava com exaltado entusiasmo, e não foi a recente biografia de Filipa Martins a reequacionar esse esforço, embora, em idos tempos de bibliofilia exagerada, lhe tenha comprado a obra completa. Que jaz esquecida nas prateleiras da cave!
2. Esteticamente é assaz impressivo o Sayat Nova, que o arménio Serguei Paradjanov rodou em 1968, antes de passar alguns anos nos gulags a pretexto da sua homossexualidade.
Muito embora o meu papa de estimação - Jean Luc Godard - lhe tenha gabado as muitas qualidades, a beleza do filme tem o senão de gastar minutos sem fim na revelação dos rituais religiosos, que o trovador do século XVIII acompanhava com devoção, mas colidem com a reiterada posição de tudo aquilo considerar ópio do povo, como enunciou sábio maior na sua pródiga juventude.
E isso me faz relativizar essa beleza mística em que assenta toda aquela história.
3. Na altura da publicação do ofensivo artigo do New York Times até vi sentido na crítica endereçada a Sidney Poitier por ser negro, rico e, daí, alheado da miséria em que viveriam milhões de miseráveis, que partilhariam com ele o tom de pele.
Agora corrijo essa opinião ao conhecer-lhe na biografia os momentos em que enfileirava com Harry Belafonte em iniciativas militantes a favor dos Direitos Cívicos numa postura combativa, que contradizia a cortesia excessiva dos seus personagens no cinema.
É que, no fundo, existe razão nos que dizem ninguém em comparação escandalizar-se por Bill Gates não mostrar grande empatia por todos os contemporâneos de pele branca, que vegetam, igualmente, na mais irremediável pobreza.
Sem comentários:
Enviar um comentário