Às vezes basta um parágrafo para definir um livro, que se acabou de ler. Sucede isso mesmo com o escolhido de A Outra Veneza, o pequeno testemunho de Predrag Matvejevitch sobre a cidade dos doges, que conheceu profundamente em repetidas visitas:
“Retomando os seus remos com forquetas trabalhadas, Zane levou-me por fim, por atalhos, até aos lugares onde vêm morrer as gaivotas. Exaustas, abatidas, maculadas de lama e de imundícies, agitam as asas agora impotentes para as propulsar nos ares. Atropelam-se, caem, tentam de novo levantar voo, tornam a cair. A sua plumagem está corroída, as suas esguias patas ressequidas, o pescoço desplumado. Soltam gritos roucos, pios estridentes. Há duas barene nesta parte da Laguna onde elas pousam para não tornar a partir. Ora escolhem uma, ora escolhem outra. Fazem por vezes um último esforço para ir de uma para outra. Sabe-se lá porquê.”
A Veneza de Matvejevitch nada tem a ver com os magotes de turistas, que a invadem diariamente e lhe conspurcam a antiga identidade. Conferindo-lhe uma outra, que não é senão uma sua caricatura. Pessoalmente prefiro esta, a mais genuína...
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