A circunstância dita o tipo de juízo, que façamos sobre o que quer que seja. Essa verdade lapalissiana ajusta-se plenamente a Atlantide, o filme realizado por Yuri Ancarani sobre a paisagem veneziana liberta do contacto com a quotidiana invasão alieniana representada pelos seus milhões de visitantes.
Visto na sala de cinema o filme é um objeto singular em que estranhamos a parca narrativa: seguimos o quotidiano de Daniele, que pouco se interessa pela namorada, e ainda menos pelos supostos amigos, porque o foco maior vai para a obsessão de dotar o seu barchino de um motor e de uma hélice capazes de o ajudarem a superar o record de velocidade registado para esse tipo de embarcações. Um objetivo, que o levará à autodestruição.
Visto, porém, num museu ou numa galeria de arte na condição de peça de videoarte, Atlantide torna-se mais atrativo, porque verdadeiramente apreciável na sua outra dimensão: a de um objeto estético, que dá a ver as ilhas da laguna com uma perspetiva raramente apresentada da forma como Ancarani a formula. Aí confirmamos que Veneza é muito mais do que as habituais imagens de bilhete postal por que no-la querem habitualmente apresentar.
Na primeira hipótese podemo-nos enfadar por depararmos com uma geração de jovens desinteressados do futuro contentando-se em viverem o dia-a-dia na base de fúteis ambições remuneradas pela pequena delinquência em que se vão ocupando.
Na segunda, porém, podemos ver relativizado esse apressado juízo, quando damos com a estranheza suscitada pela geométrica abstração, que mais não é afinal do que a rotação da visualização da paisagem para uma perspetiva a 90º.
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