20 de novembro de 2022
A primeira vez que fui à catedral de Rouen trazia de memória a série de quadros de Claude Monet e considerei impossível ter ele conseguido perspetiva suficientemente distanciada do monumento para vertê-lo para as telas tão enfiado o via dentro da malha urbana da cidade.
Fui depois rever as reproduções dessas obras e compreendi melhor, porque Monet não conseguiu dar uma vista completa do edifício, mas ao mesmo tempo melhor atentou nos seus rendilhados detalhes. Só essa proximidade forçada com o edifício possibilitava ambas as considerações.
Parte essencial do legado de Monet, a série dedicada à catedral situa-se temporalmente no auge do movimento impressionista para o qual contribuiu com alguns dos preceitos canónicos essenciais. No entanto, quando o pintor foi passar uma temporada na cidade - em 1872, quando tinha 31 anos - alojando-se em casa do irmão, que trabalhava na então pujante indústria química, interessava-o apenas pintar o Sena cujos matizes da água com os reflexos do sol lhe pareciam oportunos para a nova linguagem estética, que pressentia estar ao seu alcance.
A obsessão pela Catedral só aconteceu vinte anos depois, quando ali voltou e compreendeu tratar-se de desafio à medida da sua ambição. Porque as alterações da fachada ao longo do dia, mediante a mudança da inclinação do sol e os humores da meteorologia, nunca a deixavam estática na aparência por muito tempo. Por isso ele decidiu combater essa matéria como se a pedra se transformasse em vibrante carne. Ademais com tantos pormenores arquitetónicos, que lhe pareciam inesgotáveis à sua limitada atenção.
A temporada de 1892 passou sem que ele se sentisse particularmente satisfeito com os resultados. Mas, no regresso em 1893, intuiu-se dotado da capacidade em alcançar o que idealizara: ao voltar ao atelier de Giverny para concluir as peças artísticas adiantadas em Rouen, já tinha pleno domínio do conceito, que a todas organizava e conferia a coerência de uma série com trinta perspetivas diferentes sobre a mesma fachada. Por ela depreendendo-se a evolução, que o estilo nele vincou naquele período criativo.
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