15 de novembro de 2022
Fluorescente antes do 25 de abril, logo depois cresceu exponencialmente o interesse por alguns temas esotéricos, que ganhavam expressão em jornais a eles dedicados ou numa coleção de livros de capa negra da Europa-América, cujo dono, Francisco Lyon de Castro, tanto se prestigiara nos confrontos com o Estado Novo. O que poderia iludir alguns quanto à caução de credibilidade facultada por essa ilação.
Puro engano, claro: a exploração do sobrenatural estimulava a atávica ligação de muitos portugueses às crendices dos seus pais e avós, próprias de uma sociedade, que tardara a evoluir do campo para a proletarização nas cidades, e, sobretudo, desviava-os de uma Revolução, que se pretendia esfriar o mais rapidamente possível.
Acaso faltassem verbas para a divulgação dessas especulações em torno dos discos voadores ou das civilizações antigas, decerto agentes ligados a uma ativa embaixada em Sete Rios cuidariam de lhas facultar. E nem admirava que alguns desses livros sobre despertares de mágicos ou mundos esquecidos glosassem até à exaustão as teses, que a sociedade Ahnenerbe, lançada por Heinrich Himmler durante o regime nazi, esforçara-se por explorar. A busca do Santo Graal ou da Atlântida, os segredos dos cátaros de Montségur, o significado das runas escandinavas ou as origens da condição humana - fosse nas grutas do Cro-Magnon, fosse nas altitudes do Tibete -, procuravam justificar a existência dos míticos arianos de quem os alemães seriam os descendentes e que lhes justificariam os conceitos sobre a raça superior, perante a qual todas as outras deveriam ser escravizadas ou aniquiladas.
Não faltaram «cientistas» a apostarem a credibilidade em sucessivas expedições financiadas pelas SS, mesmo que algumas também implicassem missões de espionagem sob elas acobertadas. Otto Rahn, Bruno Beger, Ernst Schafer, Walther Wüst ou R.R. Schmidt foram reputados académicos que, por ambição, orgulho ou mera estupidez, quiseram contornar a verdade ditada pelos achados arqueológicos ou outros documentos, procurando dar-lhes leitura conforme aos interesses do regime que serviam sem escrúpulos. E não deixa de ser curiosa a persistência dalguns desses temas nos atuais ambientes «culturais» da extrema-direita, que procura adaptá-los à luz dos benefícios que deles crê passíveis de conseguir.
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