Sempre me têm espantado, se não mesmo indignado, a complacência manifestada pela intelectualidade francesa com escritores de extrema-direita - Céline, Paul Morand - que, no final da Segunda Guerra Mundial, só escaparam ao pelotão de fuzilamento porque, ao contrário do cúmplice Robert Brasillach, exilaram-se a tempo, respetivamente na Dinamarca e na Suíça, durante alguns anos. Morand voltaria anos depois, quando a Guerra Fria, ditava maiores receios dos comunistas do que dos antigos nazis, acabando até por ocupar a cadeira 11 da Academia Francesa quando para ela foi eleito no singular ano de 1968.
No JL de há duas semanas o poeta Nuno Júdice lembrou dele um conto publicado em 1925 e passado em Portugal onde um lente de Coimbra, conservador e ex-monárquico, era chamado do exílio em Londres para ser presidente do conselho, demonstrando comportamentos explicitamente homossexuais.
Acontece que, dezassete anos depois, quando sentiu mudados os ventos favoráveis à colaboração com os ocupantes nazis, o mesmo Morand procuraria que o governo de Vichy o nomeasse embaixador em Lisboa. Acaso sobreviesse o que já imaginava, estaria a recato dos primeiros embates justiceiros dos vencedores, pedindo asilo político a um regime com que simpatizava.
Não teve sucesso nesse plano: não só encontrou a embaixada francesa dominada por muitos gaulistas, que o trataram com a frieza óbvia, como também viu-se vetado pelo próprio governo português. Alertado por António Ferro, ainda no seu apreço, Salazar escusou-se a secundar as intenções de um autor, que ficcionara sobre um émulo que, quase em tudo quanto o caracterizava, se ajustava à sua personalidade. E o fascista francês teve de procurar abrigo noutras paragens...
Despeitado com a humilhação voltou para França e descreveu os portugueses como com luz em toda a parte, pão branco, doces, creme, táxis, estão atrasados seis anos em relação a nós”.
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