Extremamente curiosa a versão de Jean Renoir sobre A Pequena Vendedora de Fósforos, célebre conto de Andersen, que todos conhecemos quando crianças.
Numa entrevista dada quarenta anos depois a Jean Eustache o futuro realizador de Boudu Salvo das Águas ou de A Regra do Jogo confessaria o fascínio que sempre sentira pelo escritor dinamarquês, mas este filme de 1928 dava-lhe igualmente o ensejo de propiciar à atriz com que estava então casado - Catherine Hessling - uma excelente oportunidade para revelar o talento numa interpretação com algo de chaplinesco.
E Renoir, que sempre se interessara por brinquedos, compõe aqui uma cena demonstrativa dessa propensão, tanto mais que o cinema sempre seria para ele apenas mais uma dessas ferramentas de diversão com que se deleitava.
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Não sei se teremos o privilégio de vermos estreado em Portugal o filme Estadia nos Montes Fuchun, que o chinês Xiaogang Gu apresentou em Cannes no ano passado, mas quem o viu multiplica-lhe elogios por constituir um auspicioso convite à contemplação durante as mais de duas horas e meia que dura. Conterá porventura o mais belo plano-sequência do ano na cena de dez minutos em que uma rapariga passeia com o namorado à beira do rio. Ela é a neta de uma anciã espevitada, frequentada pelos quatro filhos, todos eles a contas com problemas de dinheiro, seja porque as ambições não bastam para o que têm ou o jogo se encarrega de lho sonegar.
No mais temos a China atual com as demolições aceleradas de todos os edifícios velhos para que se afirme a modernidade, o constrangimento das politicas demográficas apenas permissivas para um filho por casal ou as contradições múltiplas de uma sociedade dividida entre o problemático passado e o imprevisível futuro.
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Em 1989 estava quase sempre fora do país pelo que não pude confirmar se Assassinato sob Custódia estreou-se ou não entre nós. Mas, se tal aconteceu, não encontrei disso registo. E, no entanto, tinha Donald Sutherland, Marlon Brando, Susan Sarandon, Janet Suzman ou Michael Gambon como intérpretes, justificando só por isso o seu interesse. Mesmo que se reconheça a incapacidade do realizador, Euzhan Palcy, para ir mais além do que de uma versão do «Apartheid para Tótós».
Sutherland é uma espécie de Pangloss: apesar de ser professor de uma escola só para brancos, julga-se a viver no melhor dos mundos possíveis. A vida irá mudar totalmente, quando os escrúpulos o levam a tentar perceber a razão porque desapareceu o seu jardineiro. E, então, depara-se com o lado criminoso de um regime, que não hesita em puxar do gatilho sempre que alguma resistência encontra junto dos que considera seus escravos.
Brando, já numa época em que se limitava a fazer de ... Brando, é o advogado num julgamento, que depressa se sabe viciado por quem mexe todos os cordelinhos do poder.
O ingénuo Ben de Tolt vai ser vítima da perseverança com que procura ver feita justiça. Perdendo tudo, a começar pela família, que não compreende como pode ele pôr em causa o bem-estar apenas para apoiar quem sempre desprezara.
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Pode um filme estar datado no mesmo momento em que se estreia? A demonstração é Les Portes de La Nuit, filme que Marcel Carné rodou em 1946, pondo um jovem resistente (Yves Montand a estrear-se no cinema) a enamorar-se por uma mulher casada, cujo cunhado fora ativo colaboracionista. Se Les Enfants du Paradis fora encantatória obra-prima no ano anterior, Marcel Carné não percebeu que a Libertação tudo mudara, deixando de fazer sentido a relevância dada ao Destino ou os diálogos poéticos de Prévert.
O filme contava com presenças prestigiadas, como a de Jean Vilar ou Serge Reggiani, e podia-se nele ouvir «Les Feuilles Mortes» pela primeira vez, mas já parecia velho antes de envelhecer. E não se perspetiva que fosse particularmente diferente se Carné tivesse concretizado o desejo de o ver protagonizado por Jean Gabin e Marlène Dietrich...
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