domingo, janeiro 14, 2024

Águas Passadas, João Tordo, 2021

 

Este é o típico romance, que reconheço bem escrito, com uma trama consistente e alguma complexidade na gestão no recurso aos diversos narradores, mas tende-me a suscitar algumas objeções, que relativizam o agrado com que o li.

Perspetivado na lógica de entretenimento inteligente o romance segue os cânones do género com uma subcomissária, Pilar Benamor, a ser peça esdrúxula de uma engrenagem preconceituosa, irreverente perante a generalizada ambição quanto a medianos resultados, e insatisfeita por a ver sem escrúpulos em dar alimento aos títulos sensacionalistas dos tabloides.

A morte horrível de dois adolescentes - Charlie devolvida sem olhos pelo mar para onde fora lançada, Adriano a quem fora removido o coração antes de amarrado a uma árvore - associa banqueiros cúpidos, pedófilos e psicopatas, que usam e abusam de cúmplices amorais para executarem os seus crimes. E neles se conta um motorista, que execra quem abusa de crianças, mas “por lealdade” lhes serve de carrasco, uma professora tão desejosa em ser mãe, que predispõe-se a usar os alunos para filmagens sinistras, ou até uma criada capaz de ministrar drogas na água da subcomissária como forma de corresponder às ordens do patrão.

As objeções prendem-se com a exploração da adição masoquista da protagonista, que se dá a improvável amante por quem é abusada numa mescla de amor-ódio, que só parece servir para lhe acentuar a personalidade fora da caixa.

Talvez sejam os meus próprios preconceitos a falar, mas desagradaram-me essas partes em que Pilar parece sentir inexplicável gáudio em ser violada. E elas condicionaram-me até a leitura até à derradeira página...

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