quinta-feira, março 16, 2023

O Apocalipse segundo Coppola

 

São muitos os títulos cinematográficos, que ainda conto revisitar nos anos mais próximos, para reaferir a importância a eles atribuída, quando os vi pela primeira vez. Por isso as prateleiras da cave estão recheadas de DVD’s, cuja visão nem sequer congemino como ordenar na escala de prioridades para os projetar na parede da sala.

Apocalipse Now é um dos que mais me intimidam: vi-o no início da década de oitenta na pequena sala do Apolo 70 quando mais avisado andaria se tivesse preferido a sessão do Monumental, ali não muito distante, em cujo ecrã gigante encontraria espaço alargado para as imagens não se claustrofobizarem tão facilmente.

E, no entanto, nunca mais esqueci cenas, que ficaram segmentadas na memória  e esperam reestruturar-se num todo coerente nessa planeada revisão: as explosões do napalm ao som da voz de Jim Morrison a anunciar this is the end logo como aperitivo, a libertação de uma praia a pretexto de ter boas ondas para o surf, a pungente cena das playmates numa bravata quase surrealista, o sacrifício final do coronel Kurtz.

Tudo aquilo constitui um dobre de finados pelo colonialismo, que ali se perenizara na sequência da família francesa recuperada para a versão Redux, que ainda terei de descobrir. E, para além das conhecidas vicissitudes de uma produção turbulenta, recheada de episódios abordados num conhecido documentário sobre o seu making of, fica o enorme vazio de uma guerra, que se estiolou na abstração dos motivos fúteis que a justificaram e no inferno em que desesperaram os que por ali morreram, enlouqueceram ou nunca mais se libertaram dos traumas, que lhes legaram definitivo manto de tristeza na expressão dos seus rostos de veteranos.

O imperialismo, enquanto expressão aprofundada do capitalismo, tem aqui representadas as muitas das suas formas de perversão. 

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