segunda-feira, setembro 12, 2022

American Graffiti, George Lucas, 1973

 

Faz toda a diferença ver este filme agora, como sexagenário, e meio século atrás, quando estava a sair da adolescência como estes personagens, mas sem saber verdadeiramente como seriam os anos vindouros. Porque, agora, com tudo quanto vivi, posso concluir que ficaram por cumprir tantos sonhos - e, pessoalmente, o mais notório terá sido o de tanto nos distanciarmos da Utopia a que, então, aspirava! - mas, no essencial, tudo ter-se passado razoavelmente bem, fazendo-me chegar a 2023 com a conclusão de, justificadamente, subscrever as palavras de Violeta Parra: agradecido à Vida por ter-me dado tanto!

Que fica então da revisão deste segundo título da filmografia de George Lucas, espécie de parêntesis entre o universo de ficção científica da obra anterior (THX 1138) e a saga dedicada à Guerra das Estrelas, tornada possível com o inesperado sucesso comercial desta evocação dos anos de final da adolescência em Modesto, Califórnia em 1962? Em poucas palavras podemos descrever American Graffiti como um baile automobilístico ao som de uma sucessão de êxitos musicais da época interligados pela voz de um DJ então famoso - Wolfman Jack - cooptado para integrar o elenco da história.

Steve Bolander quer partir para a Costa Leste para prosseguir os estudos universitários, mas anseia concretizar a primeira experiência sexual com a namorada que, depois propõe ambos ampliarem com novos parceiros. Curt deveria acompanhá-lo nessa mudança de ares, mas sente-se dividido entre fazê-lo ou ficar ali até por encontrar, entretanto, uma misteriosa mulher, que lhe alimenta os mais obsessivos devaneios. John Milner é mais velho do que eles e decidiu acomodar-se ao ofício de mecânico mas, apesar de tão jovem quanto James Dean, sente-se na curva descendente, porque até o título de condutor mais rápido da cidade fica em risco, quando aparece um rival a desafia-lo (Harrison Ford num dos seus primeiros desempenhos). E há ainda o desajeitado Terry, que está decidido a perder a virgindade nessa noite em que todo o filme decorre e vê sucederem-lhe as mais rocambolescas vicissitudes, nenhuma delas tão drástica quanto a que uma legenda final informa e dá maior sentido à aparente frivolidade em que tudo acontece.

Pauline Keel teve razão ao considerar misógino um filme que reduz as personagens femininas a meras comparsas dos fantasmas dos parceiros, mas foi esse o conceito escolhido por Lucas: através dos quatro personagens quis abordar outras tantas fases da sua própria biografia, entre o jovem tímido decidido a conquistar raparigas até ao desencanto de já nem sequer contar com o favorecimento das circunstâncias para as ter como convenientes adornos a seu lado. Mas até pode-se reconhecer o quanto de documental subsiste enquanto espelho do que era a juventude americana, quando Kennedy acabara de ser assassinado e o Pentágono se afadigava na preparação da guerra no Vietname. 

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