domingo, maio 12, 2024

Apontamentos Cinéfilos (IX): Um ateu a fazer figas pelo sucesso de um cruzado

 

Numa entrevista Ingmar Bergman confessava a importância de se pôr em causa passada a fronteira dos 40 anos de idade, questionando-se sobre quanto fizera de perdurável até então.

O Sétimo Selo é um dos filmes, que resultou dessa reflexão e focalizado em temas para ele tão fundamentais quanto o eram o significado de Deus ou a inevitabilidade da morte.

Curiosamente, eu que andava de fraldas, quando o filme se estreou em 1957, sempre o tomei como um dos mais entusiasmantes de quantos vi apesar de saber-me empedernido ateu e, por isso mesmo, ciente da inexistência de um qualquer deus, só estranhando ver tanta gente inteligente rendida a tão absurda hipótese. Como compreendê-lo se a Ciência dá fartas respostas para quanto era incompreensível no tempo do cavaleiro Antonius Block?

Resta a questão da morte e de algo prosseguir num mirífico além. Em tempos alimentei alguma ansiedade por saber-me condenado ao Nada. Até sentir como muito natural a resposta dada por Saramago no documentário do Miguel Gonçalves Mendes, com o vento de Lanzarote a fazer-lhe esvoaçar as melenas: hoje está-se cá, amanhã deixa de se estar. E não há nenhum drama por tal suceder!

Temos, porém, o filme, objeto maravilhoso enquanto proposta estética com Block e seu escudeiro a percorrerem a devastada paisagem em que a peste vai dizimando figurantes. Ainda não era Sven Nykvist a assumir a direção da fotografia, mas Gunnar Fischer fez trabalho exemplar. E há essa tentativa de se enganar a Maldita numa partida de xadrez, quando é incontornável a rendição que a ela todos acabamos por manifestar... 

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