Ao ler o dossier da Visão sobre Nova Iorque lá vem a habitual ladainha sobre a criminalidade nos anos 70 e 80 e o subsequente elogio ao trumpista Rudy Giuliani que, com meios musculados, devolveu a “lei e a ordem” à cidade. Se é que alguma vez a havia tido!
Curiosamente foi por essa altura - andava nos vinte anos! - que ali estive pela primeira vez. Era jovem oficial no navio petroleiro Inago e, porque trabalhava por turnos, acordei uma manhã para ir almoçar indo à vigia para dar com uma ponte, que os entaramelados olhos quiseram ver como a sobre o Tejo.
Por breves instantes julguei ter cavalgado no tempo e estar à beira de voltar a abraçar a Elza com quem casara há um par de anos e por quem a saudade sempre foi incomensurável durante as marítimas ausências.
Afinal, olhando mais para o lado, primeiro para as recém-inauguradas Torres Gémeas, depois para a Estátua da Liberdade, concluí termos entrado no rio Hudson de que nos sabíamos próximos, quando concluíra o quarto da meia-noite às quatro da madrugada.
Porque a estadia se prolongou por uns dias pude depois fazer as primeiras descobertas da cidade. Nomeadamente a célebre Rua 42 que, com expressão lasciva, o enfermeiro Calado, classificava como a mais debochada existente no mundo.
Não foi por essa altura que descobri os excelentes museus (Guggenheim, Metropolitan ou MoMA), que viria a descobrir depois. E não fiquei alheio à latente violência, que significou ver a marca de sangue e do desenho a giz de um corpo no Union Park onde, com alguns colegas, me aprestava para fazer um piquenique. Ou o cheiro a droga no piso inferior do ferry entre Manhattan e Staten. Ou ainda um amedrontado polícia acoitado numa lavandaria do bairro italiano numa noite em que as ruas estavam desertas, a maioria das estações de metropolitano fechadas e os carros passavam a grande velocidade a nosso lado.
Porque era jovem, e porventura inconsciente, pouca importância dei aos perigos, que se anunciavam numerosos. Sei que gostei bastante da cidade, que coincidia com a dos filmes então do meu agrado como era o caso do scorcesiano Taxi Driver.
Da última vez que ali voltei a cidade estava diferente, ao que diziam mais segura - justificando descontraídas surtidas noturnas para ver um musical na Broadway ou beber um gin tonic numa cave onde músicos de jazz tocavam standards! - mas perdera a aura de trinta e cinco anos atrás. Ainda era Nova Iorque, mas sem a magia cinéfila que nela identificara. Até por ter a Trump Tower como um dos seus mais emblemáticos símbolos, mesmo não imaginando que o dono viria a ser aquilo que sabemos...
Sem comentários:
Enviar um comentário