Se tivesse uns quantos milhões de euros, e fosse produtor de cinema, a personalidade de Mário Soares seria uma das mais estimulantes para dar a conhecer em forma de filme. Ou de filmes, porque teria de abordá-la em diversas variações: na deportação em São Tomé, quando o fascismo ainda parecia tão fortalecido depois de assassinar Humberto Delgado; no exílio francês, quando soube do derrube da ditadura; na relação com Maria Barroso que, com ele teve mutuamente respeitadas divergências; na irreversível zanga com Salgado Zenha de quem fora grande amigo; na equívoca relação com Carlucci, espião da CIA, que tanto contribuiu para o promover na época do PREC; ou, ainda mais interessante, como para tudo isso olhava no fim da vida quando mostrou estar muito mais à esquerda do que aparentara em grande parte da vida política ativa no contexto democrático.
A noite eleitoral em que desfeiteou Freitas do Amaral também seria variação interessante, e Sérgio Graciano tentou agora concretizá-la. Mas, como comparativamente com Mário Soares, o seu maior rival na direita - Sá Carneiro - só deveria merecer uma curta-metragem por tão pouco haver sobre ele ilustrar para além da história de alcova! - também essa falta de substância pareceu acudir ao tosco realizador a propósito dessa figura maior da nossa História.
Não chegarei à (justa) maledicência de Luís Miguel Oliveira, quando diz péssimo o filme de Graciano, mas dá, efetivamente, pena que Mário Soares não tenha merecido realizador que melhor lhe cuidasse da contraditória natureza, aquela que, por outro lado, lhe garantiu a indesmentível grandeza...
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