A primeira vez que a Sétima Sinfonia de Sibelius me envolveu, houve algo que ressoou de forma curiosa. Uma grandiosidade, uma ambição na tessitura orquestral, talvez até um certo peso que, por um instante fugaz, me fez pensar: "Isto tem um toque de Wagner." Uma ilusão, claro, uma associação que a razão logo desfez ao mergulhar na concisão e singularidade formal de Sibelius. Afinal, onde a Sétima busca a unidade num fluxo contínuo, a obra de Wagner tende a expandir-se, a construir catedrais sonoras com uma opulência distinta.
Mas é fascinante como a mente tece essas ligações inesperadas. É como se a força imponente daquela melodia inicial, ou a forma como a orquestra se ergue em camadas, despertasse a memória de algo igualmente monumental, mesmo que os caminhos para lá chegar fossem diametralmente opostos. Sibelius, um filho da Finlândia emergente, com a sua música a respirar o "sisu" e as vastas paisagens da sua terra, construiu a sua própria linguagem. Uma intensidade por vezes quase brutal, mas límpida na intenção.
Aquela ilusão wagneriana, por mais errada que fosse do ponto de vista analítico, serviu como um portal. Um pequeno desvio que, no final, apenas realçou a originalidade de Sibelius em forjar uma obra coesa e poderosa a partir de um único movimento. A Sétima não precisa de ecos externos; ela é um universo em si mesma, um testemunho do talento que moldou a identidade sonora de uma nação.
Sempre que volto a esta Sétima Sinfonia, a ideia de a encaixar numa qualquer gaveta – seja a da vanguarda ou a do academicismo – parece-me redutora. É uma obra que dança entre os polos, recusando-se a ser confinada.
Por um lado, dizer que Sibelius era um vanguardista seria ignorar o facto de ele se ter mantido firmemente ancorado na tonalidade, enquanto à sua volta outros exploravam a atonalidade e a rutura radical. A sua busca não era pela dissonância pela dissonância, nem pela demolição das formas existentes. Ele estava a construir, não a destruir. A Sétima, com o clímax em Dó Maior e seu desenvolvimento orgânico, é a prova de uma mente que inovou, mas a partir de uma base reconhecível, não com o ímpeto iconoclasta da vanguarda.
Por outro lado, chamá-lo de académico seria um erro ainda maior. Onde está o académico que se atreveria a fundir quatro movimentos numa única e ininterrupta tapeçaria sonora? A Sétima é uma proeza de concisão e unidade formal que desafia as regras dos manuais. Não há repetições, nem a previsibilidade das progressões esperadas. Há uma economia de material, onde cada nota parece essencial, cada frase transforma-se e evolui num fluxo contínuo. É a antítese do exercício formalista; é uma respiração musical longa e coesa, com a lógica interna de Sibelius.
No fundo, a Sétima Sinfonia não é nem uma coisa nem outra. É o testemunho de um compositor que seguiu o seu caminho, alheio às modas e às restrições. Sibelius reinventou a sinfonia a partir de dentro, injetando-lhe uma vitalidade e uma originalidade que a tornam intemporal, e não a peça de um tempo ou de uma escola. É Sibelius, na forma mais pura e intransigente.
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