quarta-feira, agosto 09, 2017

(DIM) Descobrir a realidade com outro tipo de olhar

Agnès Varda cedo descobriu uma valiosa lição de vida: abrindo-se ao acaso, deixou que ele lhe fosse trazendo as suas três vidas. A de fotógrafa, a de cineasta e a de artista plástica. Em qualquer delas ganharia renome, firmaria a identidade.
A princípio, e sem qualquer formação académica que lhe fundamentasse os primeiros passos, tornou-se fotógrafa no Festival de Avignon em 1948 e nele, bem como no Thêatre National Populaire de Jean Vilar, captaria movimentos e expressões até 1960, naquilo a que chamou “composições”.
Em 1954 arriscou a rodagem do primeiro filme: «La Pointe Courte» era interpretado pelos então jovens Philippe Noiret e Sylvia Monfort e seria tido como um precursor da «nouvelle vague», com os seus escassos meios, mas muita liberdade na mistura da ficção com o olhar documental.
Daí por diante suceder-se-iam os títulos, que entusiasmariam os mais cinéfilos como «Cléo de 5 à 7», «Le Bonheur», «Les Créatures», «L’ Une Chante, l’Autre Pas» e «Saint Toit, ni Loi», com que ganharia o Leão de Ouro de Veneza em 1985. Ou, para falar das minhas escolhas pessoais, de Jacquot de Nantes (a homenagem a Jacques Démy com quem partilhou a vida durante trinta e cinco anos), «Os Respigadores e a Respigadora» ou «A Praia de Agnés». Ou ainda o recente «Visages, Villages», que co-assinou com o artista plástico J.R. e ainda nos não chegou ao alcance.
A atividade enquanto artista plástica surgiu em 2003, quando foi convidada para criar uma instalação em Veneza e a intitulou «Patatutopie», porque utilizando como matéria expositiva os comuns tubérculos.
Chegados a este verão, em que a France Culture a convidou para uma interessante masterclass, vemo-la prestes a contabilizar setenta anos de contínuo fabrico de imagens. Porque sempre entendeu a captação de alguma coisa como algo de apaixonante. O facto de não ter estudado fotografia ou cinema antes de a ambos se dedicar, permitiu-lhe criar uma obra muito pessoal sem influências preconcebidas quanto ao modo de neles se exprimir. E, se andou décadas a traduzir histórias ficcionais em fotogramas, a maturidade deu-lhe o prazer de se dedicar, sobretudo, a documentários, porque lhe serviram de alibi para melhor conhecer as pessoas, valorizando-as, contagiando-as com o seu inquebrantável entusiasmo.

Sem comentários: