terça-feira, junho 19, 2018

(DIM) «Bernadette Lafont: Et Dieu créa la femme libre» de Esther Hoffenberg (2017)


Antes de ver o documentário, que Esther Hoffenberg realizou em homenagem a Bernadette Lafont a imagem mais imediata, que dela tinha era vê-la a partilhar a cama com Françoise Lebrun e Jean Pierre Léaud em «La maman et la putain» de Jean Eustache, muito embora lhe recordasse a presença em dezenas de outros títulos do cinema francês entre os anos sessenta e já este século.
O retrato agora dado em pouco mais de uma hora recorda-a como atriz audaciosa e livre, orgulhosa de ser um dos mais significativos símbolos da Nouvelle Vague e do feminismo, sem nunca descurar um enorme apetite por viver intensamente.
Os primeiros filmes - «Les Mistons» de Truffaut, ou «Le Beau Serge» de Chabrol, ambos de 1958 - revelaram-na como espantosa na insolência e sensualidade. Na década seguinte essas características ganhariam espessura, porque á beleza acrescentaria a audácia com que assumiria o discurso feminista, mesmo que arriscando ser vista como excêntrica. A coragem com que abraçou o projeto de Eustache para o filme que se tornaria num enorme escândalo, demonstraria, para quem disse duvidasse, uma personalidade segura de si e decidida a fazer o que lhe dava na vontade. Não surpreendeu assim, que ela fosse uma das centenas de signatárias do documento em que intelectuais reconheciam ter abortado clandestinamente, razão fundamentada para exigirem a aprovação da lei da Interrupção Voluntária da Gravidez que, efetivamente, logo se garantiria.
A realizadora recorreu ao testemunho das netas e de cúmplices no ofício (Bulle Ogier, Jean-Pierre Kalfon, entre outros) para complementar a análise do percurso da atriz, também desvendada por imagens de arquivo e extratos de entrevistas desde quando era jovem até ao seu crepúsculo, quando a morte já se aproximava.
Num desses documentos de arquivo é possível ver François Truffaut nos bastidores da rodagem de «Une Belle Fille comme moi» (1972) a compará-la a ... um homem, Michel Simon, de quem ela replicaria a truculência, a vitalidade tão explosiva, quanto transgressora. Para os cineastas da Nouvelle Vague Bernadette Lafont era muito mais do que uma inspiração.

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