Vemos, ouvimos, lemos e experimentamos. Tanto quanto possível pensamos pela nossa própria cabeça...
quinta-feira, dezembro 29, 2011
Documentário: SAYOMÉ de Nikos Dayandas (2011)

Bob Dylan: Dont Look Back - Clip
Don’t Look Back é um documentário que acompanha a digressão de 1965 de Bob Dylan pelo Reino Unido.
Na época Dylan era um jovem arrogante, sempre disposto ao confronto com quem dele pudesse discordar e vivia a relação amorosa com Joan Baez. Uma das cenas mais recordadas do filme é precisamente quando ambos cantam temas de Hank Williams num quarto de hotel.
Sucedem-se assim as cenas de bastidores com entrevistas, conversas com elementos do staff ou outros músicos que o visitam como Alan Price ou Donovan, ou mesmo poetas do calibre de um Allan Ginsberg. Acrescentando-se-lhes extractos do concerto no Royal Albert Hall.
Comecei a ouvir falar deste filme alguns anos depois, quando costumava passar nas Quinzenas do Monumental ou nos ciclos do Império, que faziam convergir estudantes de todas as faculdades lisboetas ao Saldanha ou à Alameda ao fins da tarde dos dias de semana. Só não lembro se o vi ainda antes ou depois do 25 de Abril. De qualquer forma fazia, então, todo o sentido o poema que diagnosticava um tempo de mudança. Mesmo se aquela a que aspirávamos já nada tivesse a ver com Dylan, que desde o seu desastre de mota mudara de voz, de discurso e de valores. Se é que alguma vez ele terá justificado as expectativas ideológicas nele investidas por um Pete Seeger, que tanto contribuira para ele sair do anonimato e chegar ao estrelato, enquanto possível sucessor de Woody Guthrie.
O filme é, pois, um documento sobre um momento específico da vida de um cantor, que já passou por tantas fases, mas nunca se conseguiu dissociar desta, que foi a mais marcante do seu percurso.
domingo, dezembro 25, 2011
Made In Dagenham - Official Trailer [HD]
Em 1968 as operárias da fábrica da Ford em Dagenham fizeram uma greve bem sucedida para fazer valer o princípio da remuneração igual para trabalho igual.
Elas tinham tudo contra si, contando à partida com cinco obstáculos por superar: o primeiro era a sua inexperiência, quase ingenuidade em relação às metodologias do combate sindical. Em segundo lugar as dificuldades pessoais de cada uma das envolvidas, que viam os conjugues reagirem com desconfiança, e até com oposição ao processo de luta encetado. Depois, o próprio sindicato contava com dirigentes mais dados às regalias inerentes a tal condição do que à verdadeira defesa dos seus representados. Em quarto lugar os trabalhistas no Governo, liderados por Harold Wilson, tinham contado com a complacência do patronato nas eleições, dada a promessa de reduzirem o clima de agitação social dos anos anteriores. E, finalmente, a própria Ford ameaçava com a deslocalização das suas fábricas, temerosa de que a cedência ali se transformasse numa bola de neve em todas as demais espalhadas pelo mundo industrializado.
Embora a realização não tenha nada de excepcional, o filme conta com um argumento de peso: Sally Hawkins no papel de Rita O’Grady, a confirmar-se como uma das actrizes inglesas mais versáteis do momento, recorrendo a expressões de rosto ou corporais, que acrescentam algo mais ao que os argumentistas ou o realizador pretendiam.
É claro que muito mudou desde 1968, muito por obra dos tenebrosos anos de governo de Margaret Thatcher. As lutas reivindicativas deixaram de ter este tipo de características, tornando-se muito mais duras e difíceis de vencer. Mas não deixa de ser reveladora a necessidade de recuperação dos êxitos sindicais do passado, quando o actual estado da luta de classes evidencia a relevância de todas as formas possíveis de inflectir a obscena desigualdade entre a riqueza de um punhado de privilegiados e a crescente pauperização da maioria da população europeia…
Assim como assim, este tipo de filme pode indiciar uma vaga de fundo, que cuide de atirar para o caixote do lixo da História este tipo de capitalismo depredador, assente na especulação financeira e na globalização, e que se conclui estar cada vez mais distanciado das aspirações colectivas quanto a um nível de qualidade de vida só alcançável num outro sistema politico e económico.
Nesse sentido, «Igualdade de Sexos» vale mais pela sua qualidade cinematográfica do que pelas expectativas, que permite suscitar.
quinta-feira, dezembro 22, 2011
CU: STEVE TESICH - FOUR FRIENDS
Este é decerto um dos filmes da minha vida. Não seguramente dos primeiros, que para isso há Welles, Eisenstein ou Chaplin, mas decerto entre aqueles que se visitam e revisitam sempre com o mesmo encanto. Porque trata de uma geração para quem importavam os sonhos, que pudessem realizar sem cederem ao emburguesamento a que todos acabam, mais cedo ou mais tarde, por ceder.
Há actores (Craig Wasson, mas, sobretudo Jodi Thelen) em estado de graça e a referência a tudo quanto a América iria passar durante essa década de 60, a começar pela morte de Kennedy e pelo problema dos direitos cívicos até à alunagem de Armstrong e de Aldrin na Lua, sem esquecer, obviamente, a guerra do Vietname.
Para Danilo Prozor, o protagonista, a América acaba por ser muito mais do que a promessa de sonhos condenados a frustrarem-se: ela é o espaço dilatado de tantas esperanças e tragédias por que vai passando, até se tornar possível o que sempre desejou. E que começara por perder muito cedo devido à sua imaturidade.
Nesse sentido o filme de Arthur Penn acaba por ser generoso para com o espectador, porque deixa a possibilidade de, mesmo tardando muito e implicando tanto sofrimento, o desejo mais improvável acaba por se tornar exequível. Nesse sentido ainda alimenta o mito de América, terra dos sonhos...
Mas é, também, um filme sobre as dificuldades de comunicação entre pais e filhos, já que apresentam aqueles ora como abusadores psicopatas ora como complexados perante a enorme diferença, que vai entre o seu mero esforço pela sobrevivência e a inesgotável vontade de realização pessoal dos seus rebentos.
terça-feira, dezembro 20, 2011
"Biutiful" - Trailer Legendado HD
A propósito do mais recente filme de Martin Scorcese, que começa a exibir-se em écrãs europeus, o autor da sua história, Brian Selznick, atribui três características a um bom filme: uma grande ambição, uma tragédia e um final feliz.
Quanto à grande ambição, o protagonista de Biutiful assume-a na necessidade de garantir a sobrevivência dos filhos, nem que para tal contribua para a exploração de africanos e chineses ou para a corrupção da polícia.
Tragédia há várias no filme: o cancro de Uxmal, já em fase terminal, a só lhe atribuir uma esperança de vida de apenas alguns meses; as crises bipolares da mãe dos seus filhos, sempre inevitavelmente a recair apesar de promessas em recuperações ilusórias; a deportação de muitos dos clandestinos africanos, apanhados numa emboscada policial para a qual não chegaram os subornos por ele distribuídos; ou a morte de vinte cinco chineses provocada pelos aquecedores defeituosos comprados para a camarata aonde pernoitam.
Mas não existe propriamente um final feliz, que sirva de consolação para um espectador confrontado com uma atmosfera hiper-realista em que tudo quanto pode correr de pior ao protagonista, acaba sempre por suceder por muito que ele se esforce para que tal não suceda.
Nesse sentido, quem vai ao cinema para se divertir, vem de lá com uns bons murros no estômago. O que não o predisporá para qualquer manifestação de agrado com tal experiência. Mesmo que se deva reconhecer a superlativa interpretação de Bardem...